Fui
à exposição “Comciência” da artista Patricia Piccinini. Até chegar ao local
(Centro Cultural Banco do Brasil) não tinha muita empolgação, sobretudo pela
ideia de ver seres fantásticos criados pela genética, que conviveriam conosco
em um imaginário mundo do futuro (no entanto, e fazendo um paralelo, é curioso
que eu sou um grande fã dos filmes comerciais, sempre empolgado com a próxima
estréia)...
Logo
que cheguei, a primeira obra que vi foi a
“Grande Mãe”, nesse momento tive certeza de que
meu desinteresse era justificável e minha vontade de fugir de lá e ir para
qualquer cinema aumentou, mas me contive. No entanto, era impossível não deixar
de reparar na inegável perfeição das esculturas, tinha até uma garotinha discretamente
sentada ao fundo, que somente após algum tempo notei que pertencia ao acervo,
apesar de ser peluda! Aliás, fui baixando a guarda na medida em que eu não me
cansava de reparar no zelo da artista (uma
situação de aceitação após certo estranhamento já profetizada pelos escritos do
curador na entrada do prédio), mas mesmo assim, não deixava de tentar decifrar
que sentimentos misteriosos eram aqueles que passaram a me acompanhar quando
entrei no CCBB e nascidos ao me deparar com a Grande Mãe.
Eram
sentimentos mais incômodos do que prazerosos, talvez o resultado obtido ao ver
criaturas que só faltam falar e ao lembrar da proposta de seu surgimento, um
tanto fraca, na minha opinião.
Embora
meus sentimentos continuassem indefinidos a artista ganhava pontos, pois meu
incômodo era certamente proposital para que assim seu trabalho manifestasse a natureza
da arte, nos retirando de um estado de espírito cotidiano
para que algum outro tome seu lugar. E talvez seja ainda mais pertinente que surja
eventualmente um estado confuso, que nos induza mais facilmente a refletir.
Quando
me deparei com a peça “O Visitante Bem-Vindo” (foto) tive essa experiência
provocativa: por alguns instantes imaginei que ela representava uma cena pesada,
em que a criatura atacava a menina. Essa impressão persistiu até o momento em
que, me aproximei dos personagens e assim pude notar um semblante de afeto
mútuo em seus rostos, até para minha surpresa, pois ao longe estava certo de
que o herói tinha uma expressão perversa. Somente nesse momento a presença do
pavão se tornou mais clara para mim, fazendo-me atentar para a beleza e
colorido de suas penas, até então ofuscadas pela minha primeira impressão.
Inicialmente
conclui algo incorreto sobre o que ocorria, avaliei a intenção da criatura
erroneamente e nem percebi direito o inusitado pavão, que por si é bastante
chamativo (quem diria empoleirado em uma cabeceira), para logo em seguida,
desconcertado, compreender melhor não só a cena, mas a mim mesmo. Achei genial!
Fiquei
pensando, quantas vezes será que deixei de me aproximar de algo para avaliá-lo
melhor e não guardar uma primeira impressão que pode ser errada? E talvez ainda
mais significativo, diferente do que ocorreu naquela exposição, será que na
vida tenho disposição ou mesmo oportunidade para me aproximar daquilo que de
cara conceituo?
E
você enxerga o quê nessa imagem? Ela também revela algo sobre você?
Penso
que lá vi extremos. Esculturas impecáveis, fruto de uma proposta que considerei
fraca, personagens quase reais e quase todos feios (e
por que seriam bonitos?), tive percepções e pensamentos simultaneamente
opostos. Nesse sentido, para mim a Patricia Piccinini criou um mundo em sua
imaginação distante do nosso principalmente pelo avanço tecnológico e pelos
seres que habitariam nele, mas o aproximou do nosso ao nos fazer observadores
do contraste que ocorre em ambos e que nos é tão familiar: a coexistência do
genial e do fraco, do belo e do feio, do coerente e do incoerente, das
convicções e das dúvidas.
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